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Especialistas debatem sobre liberdade de expressão e democracia

Participaram como painelistas, Marcelo Semer, Andréa Pachá, João Paulo Capelotti e Leonardo Sakamoto

Publicado em 30 de Set de 2022, 20h20. Atualizado em 3 de Out de 2022, 10h53
Por Irma Helenn Cabral

Os limites da liberdade de expressão no contexto democrático e constitucional foram amplamente discutidos durante seminário realizado, na sexta-feira (30), pelo Tribunal de Justiça (TJMA) e o Ministério Público do Maranhão (MPMA), por meio de suas escolas superiores – ESMAM e ESMP. O evento, realizado no auditório da Procuradoria-Geral de Justiça, em São Luís, reuniu membros e servidores do Judiciário e MPMA, além de operadores do Direito, profissionais e acadêmicos de diversas áreas.

Participaram como painelistas, Marcelo Semer (desembargador do TJSP), Andréa Pachá (desembargadora do TJRJ), o advogado João Paulo Capelotti e o jornalista Leonardo Sakamoto, que trouxeram reflexões acerca dos limites no exercício das liberdades, especialmente a de expressão – temas sensíveis e necessários ao debate e ao bom funcionamento da democracia.

Na solenidade de abertura, o presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão, desembargador Paulo Velten Pereira, falou sobre a importância do tema para o momento atual, em que o país se prepara para novas eleições, em meio a episódios de ataques às instituições democráticas e à polarização política.

“Eventos como esse nos dão a liberdade de refletir sobre temas importantes do momento, e nos educam para essa grande aventura, que é viver em democracia, cultuando as instituições do Estado, o respeito à jurisdição constitucional, às instituições da justiça. É bem-vinda a discussão, o debate, a crítica, mas sempre num ambiente de tolerância e de respeito”, asseverou.

LIMITES

Para Velten, o grande desafio do momento é encontrar o ponto de equilíbrio sobre os limites da liberdade de expressão, para que esse direito fundamental não entre em confronto com outros direitos, ameaçando a própria manutenção do ambiente democrático em que foi conquistado.  

Da mesma forma, o procurador-geral de Justiça do Maranhão, Eduardo Nicolau, chamou a atenção para o fato de que, quando a liberdade de expressão passa de discurso à ação, poderá transformar-se em ameaça à democracia, exigindo a punição por meio dos instrumentos legais para a imposição de limites. “É necessário proteger a democracia com os instrumentos que só podem existir no contexto dela própria. E o Judiciário e o Ministério Público têm um papel central nesse gigantesco desafio”, indicou.

A diretora da Escola Superior do Ministério Público (ESMP), Karla Adriana Vieira, enfatizou a importância do tema e a parceria institucional na realização do evento. “É um tema avassalador. Democracia e liberdade andam irmanadas. A liberdade democrática clássica está representada pela liberdade de expressão. Ambas são pilares fundantes desta nação”, destacou.

O desembargador José Jorge Figueiredo dos Anjos, diretor da Escola Superior da Magistratura, reforçou a mensagem de que a liberdade de expressão não é absoluta, porque não se sobrepõe à dignidade da pessoa humana. “A lei proíbe ofensas à dignidade das pessoas, e não existe liberdade de expressão para justificar ataques às instituições democráticas”, enfatizou.

Jorge Figueiredo acrescentou que, em tempos de polarização inflamada, é necessário o uso da razão e da ponderação. “Tais virtudes passam, necessariamente, pelo crivo do conhecimento. O presente seminário propõe reflexão acerca de temática tão relevante e com limites tão tênues. Os diferentes painéis abordam temas sensíveis, porém necessários de maturação para assegurar o bom funcionamento da democracia”, finalizou.

PAINÉIS  

No primeiro painel da manhã, sobre “Liberdade de expressão, cidadania e redes sociais”, o desembargador do TJSP, Marcelo Semer, falou sobre marcos regulatórios do uso dos ambientes tecnológicos, ressaltando a importância dessas diretrizes e a função do Judiciário na garantia das liberdades.  Para o magistrado, toda legislação que tem como objeto as tecnologias precisam estar em constante atualização.  “As próprias redes, muitas vezes por exigência legal ou não, acabam se restringindo, por meio dos algoritmos e big techs, que exercem um grande controle privado sobre a internet”, observou.

 

Desembargadores Rogério Semer (TJSP) e Jorge Figueiredo (ESMAM - TJMA)

Quanto à função do poder público, Semer, disse que o Judiciário deve agir numa via de mão dupla: garantindo a liberdade de expressão e o debate, mas restringindo os temas que propagam ódio, guerra e discriminação de todos os tipos. “Não existe nada que possa ser absoluto. É um direito fundamental que se articula com outros. A liberdade de expressão não pode atingir a dignidade humana”, pontuou.

LINGUAGENS, HUMOR E POLARIZAÇÃO

O advogado João Paulo Capelotti, doutor e mestre em Direito Civil, expôs sobre “O humor e os limites da liberdade de expressão”, apresentando resultados de sua pesquisa que analisou centenas de decisões judiciais, tentando verificar quais são os limites que são objetivamente traçados pelos tribunais a respeito das manifestações humorísticas.

O pesquisador, autor do livro "O humor e os limites da liberdade expressão - teoria e jurisprudência" (editora Dialética), pontuou que há diversos tipos de manifestação humorística, e que não é possível traçar, antecipadamente, se uma manifestação é lícita ou não, depende muito do caso concreto, de quem é o humorista, a pessoa sobre quem trata a piada, o contexto em que se dá – público, rede social, ambiente doméstico, entre outros fatores.

 

João Paulo Capelotti e o juiz Marco Adriano Fonseca

De acordo com os estudos realizados, 70% das ações com pedido de indenização por dano moral envolvendo políticos citados em manifestações humorísticas, charges, programas de TV, memes e outras, são julgadas improcedentes.

“Isso acontece porque existe um ambiente de maior tolerância a respeito do humor, quando se trata de um assunto de interesse público, relacionado à política, à sociedade, à cultura. Já grande maioria das ações de vítimas de pegadinhas é julgada procedente, porque se considera que é uma agressão injustificada à esfera física das pessoas”, comparou.

A desembargadora do TJRJ, Andréa Pachá, participou do seminário por videoconferência, para tratar do tema “Liberdade de expressão e a linguagem das redes – avanços ou retrocesso?”. A magistrada chamou a atenção para o uso das redes por parte de membros do Judiciário, salientando que alguns discursos individuais veiculados nesses ambientes são repercutidos como opinião da instituição que representam. “Não é um exercício de liberdade se aproximar desses espaços para promover uma explosão de opiniões”, disse.

Desembargadora Andréa Pachá participou por videoconferência 

Na opinião dela, a linguagem da vingança tem substituído a linguagem da justiça e do amor no ambiente das redes, quando se usa a liberdade de expressão para impor exclusão, ódio e silêncio, fazendo do arbítrio liberdade e da violência expressão. “Haverá um tempo em que não será necessário experimentar liberdade para explicá-la”, finalizou, citando a escritora Clarice Lispector.

POLARIZAÇÃO POLÍTICA

No quarto e último painel da tarde, o jornalista Leonardo Sakamoto falou sobre “Liberdade de expressão e democracia”. Doutor e mestre em Ciência Política, ele abordou sobre um tipo de polarização política on-line e off-line que vem assumindo proporções preocupantes no mundo e que já é visível no Brasil.

 

Por videoconferência, Leonardo Sakamoto discutiu sobre a polarização política nas redes sociais 

A partir de gráficos com mapeamentos do comportamento online de usuários de redes sociais em países fortemente polarizados, Sakamoto demonstrou que, apesar da internet possibilitar mais vozes, não necessariamente tem contribuído para levar as sociedades a uma democracia plural e tolerante. “Esses ambientes criam bolhas que podem se transformar em caixas de reverberação em torno de si, e fazem com que as pessoas não tenham acesso e não se importem com qualquer outro assunto que esteja fora da sua bolha", avaliou.  

Desembargador Lourival Serejo (TJMA) e a jornalista Edvânia Kátia (TRT-MA) coordenaram o painel 4

Participaram como mediadores das palestras o juiz Marco Adriano Fonseca, os desembargadores Lourival Serejo e José Jorge Figueiredo, e a jornalista Edvânia Kátia. Também integraram a mesa de abertura do evento, o presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA), Holídice Barros; e a chefe do Centro de Estudos da Procuradoria-Geral do Estado, Luciana Cardoso Maia.

 

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