Uma das mais importantes conquistas no combate à violência contra a mulher no Brasil, a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06) completa 17 anos. Criada em 7 de agosto de 2006, essa legislação representa um marco histórico na luta pelos direitos das mulheres e na busca por uma sociedade mais igualitária e justa, abraçando também mulheres travestis e transexuais.
No Maranhão, até julho de 2023, 16.037 ações penais envolvendo violência contra a mulher tramitavam nas diversas comarca do Estado. Para garantir a aplicação adequada da Lei e manter magistradas, magistrados, servidores e servidoras do Tribunal de Justiça atualizados quanto à norma e suas alterações, a Escola Superior da Magistratura (ESMAM), atenta às atualizações do Direito Penal e Processual Penal, promove cursos e eventos de formação continuada, voltados para os profissionais que lidam diariamente com a prevenção, combate e processamento de ações judiciais envolvendo mulheres, a proteção de vulneráveis e violência de gênero.
Os cursos oferecidos não se limitam apenas ao conhecimento técnico jurídico, mas também têm como propósito estimular a humanização e a sensibilização das magistradas e magistrados, permitindo, dentre outras coisas, que seja promovida a dignidade das mulheres, de maneira ética e sem reprodução de estereótipos, revitimização/retraumatização e discriminações e violências de gênero.
“A formação vai além da compreensão da Lei e suas nuances”, ressalta a professora doutora em Direito, Bruna Waquim, formadora da ESMAM. Para ela, é fundamental que os profissionais também desenvolvam empatia diante das experiências dolorosas vivenciadas pelas partes envolvidas nos processos. “Ser capaz de enxergar as diversas facetas das situações de vulnerabilidade e, ao mesmo tempo, instilar um sentimento de segurança e confiança nas pessoas que buscam a tutela do Estado é essencial. Dessa forma, o trabalho de instrução e julgamento torna-se muito mais eficiente ao garantir a efetiva distribuição da justiça e a pacificação dos conflitos”, defende.
A Lei Maria da Penha foi tema nos últimos dois anos de formações para cerca de 240 juízes e juízas, ao ser discutida nos cursos de Direitos Fundamentais e Gênero, Aplicabilidade do Formulário Nacional de Avaliação de Risco e atuação do Poder Judiciário com Perspectiva de Gênero, Questões Controvertidas na Lei Maria da Penha, Crimes contra as Mulheres e Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, Gênero e Patriarcado no Contexto da Magistratura, Violência e Proteção no Ambiente Virtual, Direito da Antidiscriminação, Proteção dos Vulneráveis na Família, Apoio e Atendimento às Vítimas de Violência.
INTERDISCIPLINARIDADE
“São oportunidades para conhecer a história dos institutos, a evolução das leis, os precedentes brasileiros e no direito comparado, os atravessamentos interdisciplinares da psicologia, sociologia e vários outros ramos. Alunos e alunas também trocam experiências processuais e de pesquisa e isso enriquece sobremaneira os cursos com a temática”, avalia Bruna Waquim, autora de "Relações Simultâneas Conjugais: o lugar da Outra no Direito de Família", dentre outros títulos sobre alienação parental.
A professora chama a atenção nas formações para o fato de que as medidas de proteção previstas nos artigos 22 a 24 da Lei Maria da Penha são meramente exemplificativas, ou seja, de acordo com o caso concreto, pode o juiz ou a juíza adotar outras providências que entenda pertinentes, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, como esclarece o parágrafo primeiro do artigo 22.
Para a advogada Alice Bianchini, que ministra o curso Crimes Contra as Mulheres, a violência de gênero ainda é muito naturalizada na nossa sociedade. Por conta disso, a busca da solução acertada em processos judiciais que envolvam mulheres exige do/a julgador/a um conhecimento das questões de gênero, sob pena da decisão reforçar a carga de vulnerabilização das mulheres. "É necessário, também, conhecer os obstáculos que dificultam e/ou impedem a promoção efetiva e eficaz da política judiciária de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher para buscar meios de enfrentá-los", observa.
Autora de livros e doutora em Direito Penal, Biachini pontua que cursos voltados à temática de gênero permitem que magistrados e magistradas sejam capazes de agir de maneira efetiva, adequada, proporcional e com perspectiva de gênero nos processos que envolvem mulheres (seja no polo ativo ou passivo), por meio da aplicação dos instrumentos (nacionais e internacionais – controle da constitucionalidade e da convencionalidade) e da jurisprudência nacional e internacional (principalmente da Corte Interamericana de Direitos Humanos) que versam sobre os direitos das mulheres, analisados, estudados e debatidos durante os cursos. Dois instrumentos muito importantes: Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (CNJ, Resolução 492/2023) e Formulário Nacional de Avaliação de Riscos (Lei 14.149/2021).
"Um dos eixos de atuação da Lei Maria da Penha é a responsabilização, ou seja, diferente daquele velho ditado, que infelizmente ainda permanece na mente de pessoas na sociedade, de que 'em briga de marido e mulher ninguém mete a colher', a legislação busca agir direta ou indiretamente em relação à violência. Ela, na verdade, é uma decorrência da norma constitucional que prevê que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações (art. 226, § 8ª)", conclui Bianchini.
MEDIDAS PROTETIVAS
A formação de qualidade para quem atua na aplicação da Lei impulsiona o alcance social e a difusão dos direitos dela advindos. A Justiça do Maranhão concedeu, no primeiro semestre de 2023, 9.322 medidas protetivas de urgência (MOPUs) a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, entre solicitações presenciais e on-line.
As medidas protetivas são ordens judiciais - instituídas pela Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) - concedidas com a finalidade de proteger mulheres que estejam em situação de risco, perigo ou vulnerabilidade e contribuem para a luta contra a violência de gênero ao possibilitar que as mulheres solicitem proteção nos primeiros sinais de violência (psicológica, sexual, moral, patrimonial e física).
Para pedir a medida protetiva on-line, basta que a mulher preencha um formulário eletrônico em cinco etapas: qualificação da vítima; qualificação do agressor; local do fato; questionário e anexos. Para acessar a ferramenta é só clicar no perfil "Cidadão" e, em seguida, no botão Medida Protetiva.
Finalizado o preenchimento, o Sistema do Processo Judicial eletrônico (PJe) recebe o pedido de medida protetiva que é automaticamente direcionado a uma Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. A partir do recebimento do pedido, o magistrado ou magistrada tem até 48h para fazer o deferimento ou não.
MARIA DA PENHA
A Lei leva o nome de Maria da Penha Maia Fernandes - mulher brasileira que, após sofrer duas tentativas de homicídio por parte de seu então marido, se tornou símbolo da resistência e da luta contra a violência doméstica. Desde sua promulgação, tem sido uma ferramenta crucial na proteção às vítimas de violência, estabelecendo mecanismos para coibir agressões, punir agressores e promover a assistência e amparo às vítimas. Através dela, foram criados instrumentos como as medidas protetivas de urgência, que visam resguardar a integridade física e psicológica das mulheres em situação de vulnerabilidade.
Além disso, a legislação promove a conscientização sobre a violência doméstica e familiar, buscando mudar paradigmas culturais e estimular uma sociedade mais consciente e engajada na erradicação desse problema.
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