A manhã do 2º Encontro de Vice-Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil (Enavip), nesta sexta-feira (16/08), em São Luís, foi dedicada a palestras sobre temas relacionados ao sistema de precedentes e à inteligência artificial. O evento realizado no Hotel Luzeiros foi organizado pelo Colégio Permanente de Vice-presidentes dos Tribunais de Justiça.
Os trabalhos desta sexta foram conduzidos pela presidente do CPVIP, desembargadora Maria Erotides Kneip, ao lado do vice-presidente do Colégio, desembargador Artur César, e do vice-presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão, desembargador Raimundo Bogéa, na companhia de vice-presidentes e juízes dos demais tribunais.
Na primeira palestra realizada no Salão Igaraté II, nesta sexta, o juiz Gerardo Humberto Alves da Silva Júnior, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJMT), falou sobre “Os juízes e o sistema de precedentes: a doutrina da responsabilidade institucional”. Precedentes são decisões judiciais de casos concretos, que podem servir de exemplo para outros julgamentos semelhantes.
O magistrado abordou características do Civil Law – sistema jurídico derivado do direito romano, conhecido como direito civil romano ou direito continental – e do Common Law – baseado em jurisprudência e precedentes judiciais –, com origem na Inglaterra. O juiz também falou sobre as propostas de filtros de relevância para precedentes, segurança jurídica, entre outros tópicos.
Gerardo Humberto entende que no Brasil, culturalmente, o juiz é formado na ideia do individualismo. Acrescenta que o sistema de precedentes exige a coerência da ordem jurídica, em que o juiz não pode decidir fora do próprio sistema, sob pena de configurar o que se denomina de evidente arbitrariedade.
“Alguns autores, por exemplo, denominam que decidir contra o precedente é um duplo golpe contra o Estado, porque você viola a autoridade da legislação e você viola a autoridade da decisão de uma Corte Suprema, então, isso é inconcebível”, destacou o juiz, que entende que o Judiciário está passando por um processo de mutação, com necessidade de mudança cultural, a não ser em casos de exceção.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
Na palestra seguinte, com João Thiago de França Guerra, juiz assessor da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e também juiz do TJMT, no mesmo local, o tema foi “Desenvolvimento colaborativo de inteligência artificial para o Judiciário brasileiro: experiências e oportunidades”.
Guerra disse que o Judiciário – especialmente o CNJ – tem se debruçado sobre a inteligência artificial nos últimos 15 anos, sem deslumbramento e sem as promessas de soluções simples e fáceis do mercado, por entender que o setor é altamente complexo, com problemas difíceis de serem resolvidos.
“Tudo o que for ser feito para o judiciário, em termos de inteligência artificial, precisa ser feito com prudência, com responsabilidade e entendendo que a gente precisa de investimento sério, de tempo para a maturação, de tempo para ajustes, para a gente poder, a partir de um problema certo e determinado, construir uma solução capaz de interagir de forma assertiva com o nosso público interno, senão a gente vai ter soluções generalistas para problemas indeterminados, que só servem para consumir recursos financeiros e tempo, sem contribuir, efetivamente, para a realidade do Judiciário”, disse João Thiago Guerra, para quem, a prioridade do Judiciário é o que pode atender à maior quantidade possível de pessoas.
Como exemplo bem-sucedido de ação do Judiciário, citou a integração ao Codex, plataforma que consolida as bases de dados processuais. “Parabéns a todos os tribunais, que entenderam a importância disso”, elogiou, citando os mais de 278 milhões de processos integrados ao Codex, no CNJ. “Hoje, na maior parte dos Tribunais, quando um processo nasce no seu Tribunal, em menos de dez minutos depois, ele já está no Codex”.
O magistrado contou com a participação, por videoconferência, de Adriano Araújo, também juiz auxiliar da Presidência do CNJ na área de Tecnologia da Informação; Jairo Simão Melo, coordenador de Inovação e Prospecção Tecnológica do Conselho; e Cristiany Souza, gerente de projetos de Inteligência Artificial PJ4/PNUD.
Adriano Araújo falou sobre um dos sistemas nacionais que o CNJ desenvolveu em cooperação como PNUD, atualmente em projeto-piloto produtivo no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, o Módulo de Gabinete, voltado aos gabinetes judiciais, com foco particular no modelo de inteligência artificial do sistema, que sugere precedentes, a partir da petição inicial de processos.
Jairo e Cristiany também ressaltaram a importância da qualidade de informação de dados em projetos de IA e o ciclo de vida dos modelos, entre outros tópicos.
Ao final, o juiz João Thiago Guerra voltou para lançar um desafio aos tribunais, no contexto do Prêmio CNJ de Qualidade 2025: aumentar a qualidade dos dados do Codex para geração de datasets (conjunto de dados) relacionados ao sistema de precedentes qualificados.
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